Efeitos Terapêuticos do Canabidiol no Tratamento de Demências como a Doença de Alzheimer
Resumo:
A demência é uma síndrome clínica caracterizada por sintomas que progressivamente reduzem a capacidade cognitiva e funcional do cérebro, afetando vários aspectos da vida do indivíduo. Os sintomas se apresentam de várias formas, e dentre estas, a perda de memória aparece em cerca de 70-80% desses indivíduos. A doença de Alzheimer é a forma mais comum da demência, podendo atingir em 2050, cerca de 130 milhões de pessoas ao redor do mundo. Por causa da complexidade fisiopatológica da doença, e do seu maior fator de risco, a idade, ainda não há nenhuma medicação que possa ser admitida como tratamento ideal para evitar a progressão da mesma. Isso tem permitido que prescrições em não conformidade com as orientações da bula, sejam indicadas e realizadas para o manejo da doença, que além de aumentar os efeitos colaterais dos medicamentos, também aumentam a mortalidade desses pacientes. Dessa maneira, os estudos têm sido direcionados aos tratamentos alternativos, como o uso da Cannabis sativa e seus derivados, com foco no delta-9-hidrocannabinol (THC) e o cannabidiol (CBD), que têm se mostrado eficazes para várias doenças neurológicas e eurodegenerativas. Esta revisão teve como objetivo realizar uma discussão abrangente acerca da fisiopatologia, bem como o uso delta-9-hidrocannabinol (THC) e o cannabidiol (CBD) e no tratamento da doença de Alzheimer. Trata-se de uma revisão bibliográfica integrativa em que os mais recentes artigos (2017-2021) foram incluídos para compor a amostra da pesquisa. Todos os artigos estão contidos nas bases de dados PubMed, SciELO e Google Acadêmico, nos idiomas inglês e português. Para isso, foram utilizados as Palavras-chave “cannabis” e “alzheimer’s disease therapy”. A inclusão foi feita através da leitura dos títulos e resumo dos artigos e foram selecionados 39 artigos, dos quais 22 foram utilizados. O uso de THC e CBC em alguns estudos científicos reduz o comprometimento da memória em estágios mais avançados da DA, além de previnir e reparar a neurodegeneração e neuroinflmação e ser um possível antioxidante. É ineficaz o uso dos cannabinoides em sintomas neuropsiquiátricos e mostra efeitos benéficos no equilíbrio e na marcha. Assim foi possível identificar que, o Alzheimer é uma doença extremamente
debilitante e progressiva, e que infelizmente não há comprovação científica concreta de tratamentos eficazes para reverter ou interromper a doença.
Introdução:
A demência é uma síndrome clínica que cursa progressivamente com deterioração da capacidade cognitiva e funcional do cérebro, afetando a memória, o intelecto, habilidades sociais e o funcionamento físico do organismo. A demência se apresenta com uma série de sintomas, tais como: depressão, esquecimento, agressividade sexual, distúrbios de sono, entre outros (TIMLER et al., 2020). Sua etiologia aparece dividida em duas amplas categorias: degenerativa, que reflete o encadeamento de processos fisiopatológicos intrínsecos ao sistema nervoso central envolvendo a produção de proteínas aberrantes, e não-degenerativas, que são adquiridas ou demências secundárias ligadas à falência vascular, endócrina e traumática (ASO et al., 2016).
A doença de Alzheimer (DA) é a forma mais comum de demência afetando aproximadamente 50-70% dos idosos (TIMLER et al., 2020), atingindo no total cerca de 50 milhões de pessoas ao redor do mundo. Esse número poderá, em 2050, exceder 130 milhões. Não obstante, até o presente, nenhuma terapia demonstra redução da progressão da doença.
Existem vários motivos para isso, um deles inclui a complexidade fisiopatológica da doença e sua relação com seu maior fator de risco, a idade (SCHUBERT et al., 2019). Por isso, o manejo da DA tem sido realizado por meio da observação dos sintomas comportamentais e físicos da doença, lançando-se mão da utilização, por muitas vezes, de medicações em não conformidade com as orientações da bula – antipisicóticos, sedativos/hipnóticos, ansiolíticos, inibidores de acetilcolinesterase e antidepressivos – como forma de mascarar e aliviar os sintomas demenciais (ABATE et al., 2021). Medicações como a olanzapina, risperidona e memantina têm mostrado redução dos problemas comportamentais, embora diretrizes, pouco claras, sejam frequentemente fornecidas para administração, o que tem resultado na polifarmácia e seus inerentes riscos, levando a incontáveis efeitos colaterais e consequentemente aumentando a mortalidade em alguns pacientes (TIMLER et al., 2020).
Caracterizada pelas condições de declínio cognitivo e deterioração neuronal, os tratamentos para a DA, hoje disponíveis, tem se mostrado efetivos apenas nos estágios iniciais da doença. Sua etiologia não foi completamente descoberta, apesar dos grandes avanços nos últimos anos (ABATE et al., 2021).
Há muito tempo tem sido reconhecido o grande potencial para aplicação médica da
Cannabis sativa L em vários tipos de doenças humanas, principalmente aquelas relacionadas ao sistema nervoso central (SNC) (RAJA et al., 2020). Atualmente, o potencial terapêutico dos extratos da Cannabis sativa tem sido foco do interesse de múltiplos grupos de pesquisa ao redor do mundo. Os últimos estudos têm observado o potencial terapêutico de seus principais extratos, o delta-9- etrahydrocannabinol (THC) e o cannabidiol (CBD) no controle de náuseas produzidas durante tratamentos de quimioterapia e como estimulantes do apetite, Doença de Alzheimer: possibilidades alternativas para tratamento e prevenção – ISBN 978-65-5360-072-0 – Editora Científica Digital – www.editoracientifica.org – Vol. 1 – Ano 2022
53 durante processos de anorexia desenvolvidos em pacientes com síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS), além de ser usado como analgésico, controle de espasmos em pacientes portadores de esclerose múltipla, tratamento de glaucoma, efeito broncodilatador, efeito anticonvulsivante, alterações na cognição e memória, euforia e depressão (RAJA et al., 2020; OZAROWSKI et al., 2021).
Hoje há disponível uma grande variedade de medicações a base de canabinóides,
muitas delas já utilizadas para o tratamento de várias doenças degenerativas. Essas medicações estão classificadas em canabinóides naturais – extratos da própria planta Cannabis sativa – como o THC, CBD, e extratos da planta com vários compostos; e em canabinóides sintéticos, como o dronabinol e a nabilona (ambos miméticos ao THC) (PEPRAH & MCCORMACK, 2019). Apesar disso, a combinação do CBD (componente não psicoativo) e THC (componente psicoativo) tem mostrado melhor efetividade, devido a ambos compostos terem influência na melhora da atividade psicomotora, humor, ciclos de sono-vigília e no comportamento alimentar. Ambos compostos podem interagir com o sistema endocanabinóide humano e o sistema imunológico (MACCARRONE et al., 2017; TIMLER et al., 2020).
A DA tem grande prevalência em todo o mundo, e por não haver protocolos seguros
no manejo da doença, o que causa prescrição errônea de medicações, é necessário buscar alternativas, e por isso o uso dos CBM’s tem se mostrado eficaz, principalmente pela escassez de efeitos colaterais comparado aos medicamentos já amplamente utilizados. Por isso, esta revisão tem como objetivo, realizar uma discussão abrangente acerca da fisiopatologia, bem como o uso delta-9-hidrocannabinol (THC) e o cannabidiol (CBD) e no tratamento da doença de Alzheimer.
O Sistema Endocanabinoide
Em meio às várias vias envolvidas na fisiopatologia da DA, o sistema endocanabinóide (SEC) nesta última década tem despertado a atenção de pesquisadores ao redor do mundo. O SEC desempenha, no sistema nervoso, um importante papel como regulador de funções, como a cognição, controle de apetite e analgesia. Presume-se que os canabinóides endógenos podem mediar a plasticidade neuronal através da modulação de funções sinápticas, com potencialização e inibição. Embora o exato mecanismo molecular de sua ação
não esteja, até o presente, completamente elucidado, novas pesquisas poderão ajudar a compreender os complexos processos envolvidos (COORAY et al., 2019). A descoberta do SEC em 1990 foi um marco na história da ciência farmacêutica moderna, que possibilitou o começo dos estudos acerca do uso terapêutico da cannabis. O SEC consiste principalmente de dois receptores primários: os receptores canabinóides 1 e 2 (CB1 e CB2), ambos receptores estão acoplados a proteínas G que expressam vias de transmissão neuronal (ABATE et al., 2021).
O receptor CB1 é expresso principalmente no sistema nervoso central e encontra-
-se amplamente distribuídos em neurônios pré-sinápticos da medula espinal e gânglios Doença de Alzheimer: possibilidades alternativas para tratamento e prevenção – ISBN 978-65-5360-072-0 – Editora Científica Digital – w.editoracientifica.org – Vol. 1 – Ano 2022 60 dorsais. No cérebro estão situados principalmente na região do hipocampo. Achados importantes apontam que a função do CB1 está atrelada a neuromoduladores retrógrados inibitórios. Tem sido dado a conhecer que, os receptores pós-sinápticos CB1 intercedem à auto inibição lenta de interneurônios neocorticais, podendo inibir os canais de cálcio dependentes de voltagem e a liberação de vesículas contendo ácido gama-aminobutírico (GABA)
ou glutamato. Dependendo de como estes receptores são ativados, através da expressão GABAérgica ou glutamatérgica, a sua ativação retrógrada pode estimular formas de plasticidade neuronal a curto ou longo prazo. Nas desordens Neurológicas, o tempo de ativação e a distribuição dos receptores CB1 em terminais excitatórios e inibitórios podem estar alteradas, levando a alterações profundas de sua função. Além do mais, os receptores CB1 estimulam a proliferação de células tronco progenitoras, que podem ser relevantes para as doenças neurodegenerativas (CRISTINO et al., 2020). A distribuição cerebral de CB1 é consistente com os efeitos fisiológicos conhecidos dos canabinóides, como comprometimento da formação da memória de curto prazo, alterações da atividade motora e ansiedade (ABATE et al., 2021).
Quanto ao receptor CB2, os estudos realizados em amostras de tecido cerebral humano portadores de DA, esclerose múltipla e esclerose lateral amiotrófica, revelaram ter um papel importante na imunomodulação, como também demonstraram sua forte expressão na micróglia nestes pacientes. Outros estudos têm indicado a redução da liberação de citocina pro-inflamatórias da micróglia através do receptor CB2 na DA. No entanto, o mecanismo que altera funções neuronais ainda é desconhecido (CRISTINO et al., 2020).
A DA está relacionada a mudanças profundas nos SEC. Estudos realizados com análise histopatológica de amostras de tecido cerebral com DA, foram encontrados níveis aumentados de receptores endocanabinóides CB2 predominantemente em astrócitos e na micróglia em torno das placas β-amilóides (MACARRONE et al., 2017). Modelos experimentais de DA tem sido realizados simulando disfunções genéticas com acúmulo de peptídeos Aβ em camundongos transgênicos, em busca de novos tratamentos para a DA. Foi demonstrado que agonistas CB1/CB2 melhoraram a memória e a deficiência cognitiva dos camundongos, através da inibição da neurotoxicidade. Neste mesmo estudo foi ainda demonstrado que o antagonismo do CB1, apesar de atuar contra a toxicidade cerebral, a longo prazo, reduz a sinalização de acetilcolina, que causa comprometimento cognitivo. Se tratando no estudo de receptores CB2, os camundongos com mutação da APP ou com injeção intracerebral de Aβ, obtiveram melhora no padrão de inflamação da DA. Nos estudos in vitro e in vivo, o receptor CB2 restringiu os níveis de neurotoxicidade e mediadores pró-inflamatórios que são formados por astrócitos reativos e células microgliais. Em estudos com seres humanos que possuem DA, o receptor CB2 tem sua regulação de forma positiva nos astrócitos Doença de Alzheimer: possibilidades alternativas para tratamento e prevenção – ISBN 978-65-5360-072-0 – Editora Científica Digital – www.editoracientifica.org – Vol. 1 – Ano 2022 61 e na microglia, enquanto isso nos receptores CB1, sua expressão se mantém inalterada (CRISTINO et al., 2020).
Uso de Canabinóides Medicinais e sua Relação com a Doença de Alzheimer
Os canabinóides são compostos químicos que ligam-se aos receptores (CB1 e CB2),
e ativam proteínas que permitem a interação das substâncias no metabolismo celular. São compostos classificados em três grupos principais: endógenos, sintéticos e fitocanabinóides (VALLÉE, et al., 2017). Destes grupos, alguns já estão disponíveis para uso clínico, promovendo efeitos benéficos principalmente em várias doenças neurológicas, como Parkinson, Huntington e Alzheimer (WANG et al., 2021). Grande parte das pesquisas têm mostrado que o canabidiol (CDB) e o tetrahidrocanabidiol (THC) – como compostos sintéticos ou canabinóides puros da planta –, possuem maior efetividade no controle de determinadas doenças promovendo a melhora da atividade psicomotora, modulação do humor, efeito analgésico, estimulação do apetite e diminuição dos sintomas neuropsiquiátricos, com destaque a efeitos positivos na doença demencial e controle dos sintomas comportamentais. Isso se
deve, principalmente, ao fato da atuação dessas substâncias no sistema endocanabinóide (SÁNCHEZ et al., 2019; TIMLER et al., 2020).
Por motivo e necessidade da busca de melhores tratamentos farmacológicos para várias doenças crônicas, tem crescido o número de pesquisas acerca dos potenciais benefícios do complexo CDB/THC, para que futuramente possam a virem ser aprovados como terapia. Foi assim com o CDB, que no ano de 2018, teve aprovado seu uso para o tratamento de duas doenças epiléticas infantis, como a síndrome de Lennox-Gastaut e a síndrome de Dravet (OZAROWSKI et al., 2021).
Canabidiol
O Canabidiol (CBD) é o segundo fitocanabinóide mais abundante na Cannabis sativa,
apresenta baixa afinidade pelos receptores CB1 e CB2, e não provoca psicoatividade. É um medicamento com múltiplos mecanismos de ação, atuando em diversos outros receptores, como o 5HT1A, um receptor do tipo serotoninérgico, o que explica seu potencial ansiolítico (NOREEN, et al.,2018; LI et al., 2020; ABATE, et al.,2021).
Na caracterização pré-clínica, o CBD exibiu propriedades neuroprotetoras, anti-inflamatórias e ansiolíticas, ao provocar forte efeito antioxidante contra o glutamato em cultura neuronal primaria e na toxicidade induzida pelo peptídeo β-amiloide em células neuronais de ratos, ao inibir a hiperfosforilação da proteína tau (SÁNCHEZ et al., 2019; ABATE et al., 2021).
A via de sinalização Wnt que regula diversos fenômenos e eventos durante o desenvolvimento embrionário neural e na mediação da homeostase neuronal na idade adulta, a sua Doença de Alzheimer: possibilidades alternativas para tratamento e prevenção – ISBN 978-65-5360-072-0 – Editora Científica Digital – www.editoracientifica.org – Vol. 1 – Ano 2022 62
desregulação está implicada em várias doenças, particularmente em doenças neurológicas.
Para o equilíbrio dessa via, isto é, para que haja controle, existe um complexo de destruição que é composto pelas proteínas, Axin, APC e GSK-3β. Dessa forma, o CBD reduz a ativação do gene GSK3 (inibidor da via Wnt) em células PC12 – uma linha celular derivada da medula adrenal de ratos, originada da crista neural, possuindo células neuroblásticas – e inibe a deposição de Aβ e a hiperfosforilação da proteína tau induzida, o que resulta na atenuação do estresse oxidativo (VALLÉE et al., 2017; LI et al., 2020).
Na biologia molecular, os receptores ativados por proliferador de peroxissoma, conhecidos como PPAR, são importantes na modulação da doença de Alzheimer. Estudos in vivo mostraram que os níveis destes receptores estão elevados na doença, exercendo papel de modulação na neuroinflamação. Esse grupo de proteínas regulam respostas inflamatórias por meio da inibição da produção de citocinas pró-inflamatórias, como o fator inibidor de necrose tumoral (TNF), interleucina-1, interleucina-6, entre outros. Assim, quando o PPAR é ativado, o CBD age através do aumento da sobrevivência neuronal por meio da redução da
apoptose e dos níveis da proteína precursora de amilóide. Isto posto, o CBD pode suprimir a atividade pró-inflamatória e neuroinflamatória (VALLÉE et al., 2017; MANNUCCI et al., 2017).
Em células-tronco mesenquimais tratadas com CBD, foi observada uma menor expressão gênica de alguns genes específicos associados à DA, incluindo genes que codificam as proteínas responsáveis pela fosforilação da proteína tau e produção de Aβ, como os genes β e γ-secretase. Além disso, o CBD evitou a expressão de moléculas gliais pró-inflamatórias no hipocampo induzida por Aβ de um modelo in vivo (ABATE, et al.,2021).
Recentemente, pesquisadores investigaram os efeitos do CBD na degeneração neuronal em células modelo β-amiloide s e encontraram diminuição dessa degeneração causada pela deposição βA na região de neurônios hipocampais. Os efeitos neuroprotetores do CBD estavam associados a ativação do receptor CB1 cerebral, mesmo com ligação fraca, o que mostrou potencial de tratamento em doenças neurodegenerativas. Além disso, a redução da densidade da coluna dendrítica, característica comum dos modelos de DA, foi protegida pelo CBD além de resgatar a atividade da proteína quinase II dependente de cálcio/calmodulina sináptica (CaMKII) de Aβ, em neurônios primários do hipocampo expostos ao amilóide-β. A CaMKII é uma proteína quinase que desempenha papel estrutural nas espinhas dendríticas. Dessa forma, os resultados apoiam a abordagem terapêutica potencial do CBD para pacientes com Alzheimer (EGGERS et al., 2019; HUGHES & HERRON, 2019; LI et al., 2020; WANG et al., 2021).
Em um estudo duplo-cego randomizado, foram testados os efeitos agudos do CBD
no fluxo arterial cerebral (guiados por ressonância magnética) e sua relação com a memória (quantificada através de testes clínicos). O resultado foi que o CDB, introduzido de Doença de Alzheimer: possibilidades alternativas para tratamento e prevenção – ISBN 978-65-5360-072-0 – Editora Científica Digital – www.editoracientifica.org – Vol. 1 – Ano 2022 63 forma aguda, aumenta o fluxo sanguíneo cerebral em áreas chave que envolvem a memória, particularmente no hipocampo. Apesar dessas evidências, os mecanismos precisos a este efeito ainda não são claros. Foi o primeiro estudo a encontrar essa relação e, apesar dos resultados promissores, é necessária uma maior amostragem para evidenciar com
clareza os efeitos benéficos do CDB nesse sentido, visto que não foi possível quantificar os ganhos ou perdas de memória através do exame clínico (HUGHES & HERRON, 2019; BLOOMFIELD et al., 2020). O CBD não altera a pressão arterial ou a temperatura do corpo e pode atenuar os danos cerebrais associados à neurodegeneração, além disso, altera a plasticidade sináptica e estimula a neurogênese. Os efeitos do CBD ainda não estão claros, mas parecem envolver vários alvos farmacológicos, como mencionados anteriormente, e também mostra um grande espectro de propriedades terapêuticas potenciais (VALLÉE, et al., 2017;
MANNUCCI et al., 2017).
Tetrahidrocanabidiol (THC)
O tetrahidrocanabidiol (THC), é um dos mais potentes e principais canabinóides responsáveis pelos efeitos psicoativos da Canabis sativa. O THC é um agonista parcial dos receptores CB1 e CB2. É um composto rapidamente absorvível e, por sua característica lipofílica, atravessa facilmente a barreira hematoencefálica. Seu mecanismo de ação mostrou reduzir a toxicidade glutamatérgica (responsável pelas funções excitatórias cerebrais), através da ativação dos receptores canabinóides CB1, presentes em grande parte do tecido cerebral, reduzindo o influxo de cálcio através de canais de cálcio dependentes de voltagem.
Estudos mais recentes, demonstraram os efeitos neuroprotetores do THC em camundongos modelos de Alzheimer, Parkinson e esclerose lateral amiotrófica, através da modulação das transmissões glutamato-dependentes e também por meio da modulação da resposta imune (SÁNCHEZ et al., 2019; RAJA et al., 2020).
Uma pesquisa observacional buscou averiguar o quão eficaz é o óleo de cannabis
(extrato vegetal contendo 1,65% de THC) no controle de sintomas nos âmbitos psicológicos e comportamentais da demência em 11 pacientes hospitalizados com DA. Como resultado, foi encontrado significativa diminuição de pontuações no Inventário Neuropsiquiátrico (questionário com base nas alterações ocorridas a partir do momento em que o idoso começa a manifestar problemas de memória) desde o início até a quarta semana e em contrapartida, nenhuma mudança significativa no peso ou nas pontuações do mini-exame do estado mental
(INGLET et al., 2020).
Uma estudo de meta-análise recente incluindo seis casos-controle randomizados em
pacientes com DA que receberam THC em forma oral, dronabinol ou nabilona (seus análogos) Doença de Alzheimer: possibilidades alternativas para tratamento e prevenção – ISBN 978-65-5360-072-0 – Editora Científica Digital – www.editoracientifica.org – Vol. 1 – Ano 2022 64 para o controle dos sintomas agressivos da doença demencial. Concordantemente, os autores não identificaram redução significativa da agitação nesses pacientes em comparação ao grupo placebo (INGLET et al., 2020).
Apesar das vantagens, o THC foi identificado como o principal derivado psicotrópico da Canabis sativa, induzindo efeitos como catalepsia, hipoatividade psicomotora, analgesia e hipotermia em camundongos. Embora haja essa mediação de efeitos eufóricos, não se tem razão para acreditar em efeitos benéficos medicinais relevantes desse composto, sendo o CBD clinicamente mais relevante por seu potencial terapêutico atingir não só o sistema canabinóide e seus receptores, mas também a modulação de várias proteínas e interação com o sistema imunológico. A modulação psicoativa do THC é estreita por sua janela terapêutica, limitando suas aplicações, sendo o CBD mais suscetível a aplicação clínica, inclusive em crianças (CRISTINO et al., 2019).
Conclusão:
O Alzheimer é uma doença neurodegenerativa e debilitante. Lamentavelmente, não
existe a comprovação científica acerca de tratamentos eficazes, capazes de reverter ou interromper a doença. Embora haja vastas evidências acerca do uso dos medicamentos à base de canabinóides, nenhuma delas foi realizada com uma amostra suficiente de pacientes para que possam entrar em protocolos de tratamento. No entanto, estas evidências, apresentadas neste capítulo, norteiam a ciência para um caminho em que são apresentados os benefícios terapêuticos do CBD, e que provavelmente, a atuação conjunta de CBD-THC possa ser o início de uma possível terapia para a DA.
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